[por Andréia Martins]
Músico que faz cinema. Artista-plástico que canta. Voz que desenha. Cineasta que versa. Imagens que compõem música. Arte soprando para os quatro cantos no chão de São Paulo, pelas mãoe s e voz do compositor e músico Kiko Dinucci.
“Tanto a música com a arte como um todo geraram muita solidão e ainda é assim. Comecei sozinho, mas com o tempo fui achando os meus iguais e aprendendo muito com eles, cada pessoa com quem eu toco é uma universidade (no bom sentido) pra mim. Gosto de trocar. É muito rico você poder se comunicar com pessoas de diferentes nacionalidades e etnias, e credos, chega a ser divino o dom que o ser humano tem de se comunicar com arte”, diz em entrevista ao Palco Alternativo.
E é assim que Kiko se comunica: por meio de imagens, sons e palavras. Hoje, além das diferentes formas de arte, Kiko se divide entre diferentes projetos na música: além de compositor e músico, divide com Douglas Germano as criações trágicas e cômicas do Duo Moviola, integra o Bando AfroMacarrônico, com o qual lançou o disco Pastiche Nagô,em 2008, e faz uma sólida parceria com a cantora Juçara Marçal, com a qual gravou o álbum Padê, e, mais recentemente, no final de 2009, lançou o disco Na Boca dos Outros.
Assim como em outros trabalhos, o disco reforça a boa parceria de Kiko com a cantora Juçara Marçal. “Juçara, pra mim, é a maior cantora que conheço. O que interessa pra ela é arte, não glamour, ser a cantora da mídia, nada disso. É só ver a postura dela no palco, é um compromisso direto com a arte, o resto que se exploda. Ela no palco vai se transformando, começa a crescer e encosta a cabeça no teto. O disco Padê foi o nosso primeiro trabalho, foi o som que moldou tudo o que viria na sequência, os elementos da cultura africana e tudo mais. Estamos pra gravar um novo CD chamado Metá Metá, em parceria com Thiago França”, conta Kiko.
Na Boca dos Outros
“O disco novo só tem meu nome mas não é solo. Quase todos meus discos levam meu nome, ou com a Juçara Marçal, ou Bando AfroMacarrônico. Todos tem a minha presença mas nenhum deles é 100% solo. Em todos a parceria é fundamental, isso fica ainda mais gritante com o Duo Moviola, com a presença do Douglas Germano. Trabalho sempre com parcerias, sejam elas com compositores, produtores ou músicos”, diz.
Para este trabalho, composto de 14 faixas, Kiko se cercou de diferentes cantores e cantoras como Fabiana Cozza, Maurício Pereira, Bruno Morais, Juçara Marçal, entre outros, cruzando ritmos brasileiros e africanos em uma linguagem voltada para o samba.
“As músicas do Na Boca dos Outros são muito antigas, tinhas teias de aranha, a maioria é de quase 10 anos atrás. O que eu fiz foi tirar da gaveta, deixar os novos arranjos determinantes no aspecto criativo e chamar as pessoas que tinham a ver com cada faixa. O fato de uma outra pessoa cantar daria uma roupagem nova a mais a essas velhas canções”. Para ouvir: http://www.myspace.com/kikodinucci.
Entre tantos lados, o lado A – Afro – de Kiko
Kiko é muitos. Já foi hardcore ao assumir a guitarra em uma das mais importantes bandas do hardcore paulista, o Personal Choice, em sua cidade natal, Guarulhos. Aí trocou a guitarra pelo violão, e mergulhou no samba, na sua brasilidade, no seu lado afro.
“Meu interesse pela cultura afro veio no dia em que eu me olhei no espelho e falei pra mim mesmo: sou preto, no Brasil todo mundo é preto, seja sua pele clara ou escura, então vou atrás da minha história. E fui atrás da minha memória ancestral e descobri meu ancestral mais antigo, que é meu Orixá Logun Edé. Mergulhei num mar de informação infinito”.
Desse mergulho saiu o documentário Dança das Cabaças, dirigido por Kiko, um retrato poético sobre a paradoxal divindade Exu e as formas como o brasileiro vê esse personagem que, na África, era caracterizado como o princípio da vida.
O filme passa pelas diversas vertentes das religiões afro-descendentes, dos candomblés (de tradição Nagô, Gege, Bantu), Tambor de Mina, passando pela Umbanda e Quimbanda. Assista ao filme em http://www.dancadascabacas.blogspot.com.
Identidade pessoal descoberta, na música, Kiko parece não ter dúvidas de quem é. Apesar de reconhecer outros elementos, especialmente ritmos afros, na sua música é tudo samba. “Posso compor um thecno brega que no fundo vai ser um samba, só sei fazer assim, graças a Deus”.