Os selos brasucas Terry Crew e Pug Records resgatam o formato vintage para lançar seus artistas e bandas
[Por Natasha Ramos]
Em tempos de MP3 e apetrechos tecnológicos que possibilitam a você levar a discografia completa do seu cantor favorito no bolso, tem surgido nos últimos anos um movimento saudosista de regresso aos modelos analógicos de escutar música.
Depois do retorno dos vinis (cuja morte havia sido anunciada com o surgimento do CD há algumas décadas, e que provaram há alguns anos que voltaram para ficar), agora é a vez das fitas cassete retornarem das cinzas.
Com mais de cinqüenta anos nas costas, essa senhora, a fita cassete (ou K7, para os íntimos) —inventada pela Philips, em 1962, para ser tocada, dentre outros players, no walkman (o pai do iPod)—, tem encontrado seu espaço em gravadoras independentes que resolveram adotar o formato para lançar seus artistas.
Alguns selos brasileiros têm realizado muito bem esse papel de resgate das K7 por aqui. Um deles é a curitibana Terry Crew, mix de selo, núcleo de produção e comunidade cultural, criado há alguns meses. “Nosso trabalho consiste em produzir todo o material áudio/visual que uma banda precisa, desde fitas, camisetas, capas, videoclipes até fotos, logos, cartazes e teasers”, explica Emil Stresser, fundador do selo e integrante da banda Subburbia, de Curitiba.
O selo, que trabalha exclusivamente com lançamentos em fitas K7, surgiu da necessidade de encontrar uma alternativa para lançar os trabalhos da Subburbia, que não fosse o CD (visto que “não conheço ninguém do meu convívio que ainda compre CD”, diz Emil) e o LP (que é absurdamente caro no Brasil). “Decidi fazer uma brincadeira e produzir algumas K7s. Acabei vendendo todas na hora! Aí, a brincadeira ficou séria”, comenta Emil.
O processo de produção das K7 pela Terry Crew é um processo artesanal e total DIY (Do It Yourself): vai desde eles conseguirem a fita, gravar um som em boa qualidade, até desmontar a fita, pintar ou fazer alguma arte nela, e imprimir as capas. As cassetes são todas decoradas e, geralmente, é a banda/cantor que faz sua própria arte. “De início, o processo parecia fácil, mas, em grande escala, se tornou no mínimo trabalhoso”, comenta Emil.
O Terry Crew leva na bagagem duas coletâneas de hits em K7: uma da banda Subburbia e outra da também curitibana Wack. Recentemente, eles fecharam com mais três bandas, cujos trabalhos devem ser lançados nos próximos meses.
Outro selo que lança os trabalhos de seus artistas em cassete é a mineira Pug Records, fundada em março de 2010, por Eduardo Vasconcelos, André Medeiros e Amanda Dias. “O selo foi criado para lançarmos e divulgarmos artistas que gostamos, para fazer as coisas do nosso jeito”, comenta Eduardo que, atualmente, toca a gravadora sozinho (os outros fundadores continuam como colaboradores).
As fitas cassete funcionam para a Pug Records como um formato físico de apoio aos trabalhos dos artistas que já são lançados em MP3 para download gratuito. “A K7 foi uma alternativa legal, pois dialoga com a nossa postura e com a nossa estética. Sob o mote ‘try this at home’, fazemos tudo em casa, gravamos os discos, “prensamos” as fitas, fazemos as capinhas… depois divulgamos na internet, ainda dentro de casa, em nossos computadores pessoais. Então, a K7 dialoga com esse processo artesanal. Também dialoga com a estética, uma vez que são gravações caseiras, lo-fi”, explica Eduardo.
Com vocação a objeto de colecionador (até por conta da tiragem limitada), as K7 são adquiridas mais por amantes de música que desejam ter aquela espécie de toy art musical em mãos, do que por colecionadores de K7, de fato. “Gravo uma por uma no meu quarto, colo os adesivos… As prensagens são bem pequenas, 100 cópias. Sendo que os downloads de um único disco chegam a 7 mim”, comenta Eduardo.
O selo já lançou diversas bandas como Coloração Desbotada, Top Surprise, Duplodeck, Ciro Madd e Filipe Alvim. “Como a maioria dos selos independentes, a Pug foi criada baseada numa certa preferência de estilo musical. Fica difícil definir, mas gostamos de melodias pop envoltas por ruídos de guitarra”, explica Eduardo. Essa playlist resume bem:
O mercado das fitas K7 (?)
Em setembro do ano passado, durante o “Cassette Store Day” (Dia da Loja de Cassetes), grupos de rock como Flaming Lips, At The Drive In e Animal Collective relançaram seus álbuns apenas em formato de fitas cassete.
A banda She&Him, da atriz queridinha pelos indies, Zooey Deschanel, também entrou na onda das K7. A dupla incluiu a fita entre os formatos em que lançou seu álbum inédito Volume Three (2013).
Caso você, leitor, seja tomado pela onda nostálgica das K7, saiba que é possível encontrar no eBay, algumas fitas de bandas como The Killers, Backstreet Boys, Garbage e Spice Girls. No entanto, é na cena independente que as fitas cassete circulam com maior facilidade.
Por esse ser um cenário pouco tangível comercialmente, fica difícil mensurar em termos de mercado o tamanho dessa “tendência” das cassetes. Os dados acabam sendo coletados da impressão de cada um nesse meio.
“Não gosto de falar em mercado, pois este é um mercado invisível. Ao contrario do vinil, você não vê lista de mais vendidos em K7. (…) Gosto de comparar este ao mercado de ‘chup-chup’ (sacolé): não dá pra saber se está crescendo, quais são os lucros, muito menos saber o camelô que vende mais sacolé na praia de domingo. É tudo muito pequeno, ainda”, explica Eduardo, da Pug Records.
Emil, da Terry Crew, tem uma visão otimista desse mercado, que, segundo ele, tem condições favoráveis para crescer. “Existe bem mais amantes das K7 do que a gente imaginava (…) Para nós, [a venda das fitas K7] está rolando super bem, afinal, não existe muita concorrência. Talvez o interesse pelas cassetes não seja tão grande quanto o do vinil, mas, acredito que o interesse pelas fitas deva crescer, visto que para se produzir um vinil no Brasil acaba saindo cem mil vezes mais caro do que produzir uma fita, que podemos vender ao preço simbólico de R$5”, completa.