Por Andréia Martins
Foram 25 anos de espera desde a primeira passagem e Bruce Springsteen pelo Brasil, em 1988. A demora em retornar, no entanto, tem um lado positivo: este é o melhor show do momento. Bruce está no auge de seu domínio total no – e do – palco. Bom para quem matou a espera no show do Espaço das Américas, em São Paulo, onde ele tocou para um público de seis mil pessoas, quase um show na sala de casa para o tamanho da estrela de Bruce, e mostrou porque segue merecendo o apelido de The Boss.
E logo nos primeiros minutos, o público caiu nas graças do cantor, que abriu o show com “Sociedade Alternativa”, música conhecida na voz de Raul Seixas. Muita gente não entendeu o que estava acontecendo. Uns entraram na vibração, outros – a minoria – torceram o nariz. Mas a verdade é que a casa já tinha vindo abaixo nos segundos iniciais do show e quem estava lá entendeu que seria uma noite inesquecível.
Foram 3h18 minutos de show (com margem de erro de um minuto para mais ou para menos), com 28 músicas, das mais recentes (“We Take Care of Each Other”, “Death to my Hometown”, “The Rising”, “American Skin”), às mais antigas e elevadas a clássicos (“Hungry Heart”, “Born to Run”, “The River”, “Born in the USA”, “Because the Night”, “Dancing in the Dark”, que transformou o local em pista de dança, entre outras).
Mas hits a parte, o que fica é o showman e a capacidade de Bruce de comandar o público e deixá-lo aos seus pés. Algumas músicas do setlist ele deixou a critério dos fãs, escolhendo as que estavam escritas em faixas levadas por fãs. O ritual consistia em pegar o cartaz da plateia, mostrá-lo para a banda e depois para o público. O fã ousado que pediu “Bobby Jean” e ainda uma ‘guitar pick’ deu a sorte de ter seus dois pedidos atendidos.
O olhar atento ao público é um dos detalhes que faz de Bruce o dono do melhor show do momento. Do selinho inesperado em uma fã, a roubada do copo de cerveja de outro – que ele virou na moral de uma só vez -, e a simpatia para com um grupo de senhoras já com seus cabelos brancos a quem ele disso no final do show: “Quero que vocês sejam minhas namoradas brasileiras”.
Acompanhado da E Street Band e seus 16 músicos – eles são “a banda”- Bruce tem a base que precisa para explodir no palco. Mesmo não sendo um exímio guitarrista, ele sabe bem o que fazer com elas, acompanhado de seu velho companheiro nas cordas, Steve van Zandt – Bruce costuma dizer que não há nada pior do que receber uma crítica de Steve, porque ele provavelmente terá razão e isso o deixa irritado. Típico do chefe.
No show, se há discos que ele prefere nunca mais lembrar ao vivo, alguns são a perfeita tradução de quem é Bruce, como Born to Run (1975) e Born in the USA (1984), clássicos de suas respectivas décadas e de onde saíram a maioria das músicas do show em São Paulo. A ‘gig’ serviu de aquecimento para sua apresentação no Rock in Rio, em 21 de setembro, véspera de seu aniversário.
Bruce estava visivelmente emocionado. Disse que depois de tanto tempo desde a primeira vez no Brasil, não esperava que as pessoas ainda acompanhassem o que ele vinha fazendo. Nessa hora boa parte da plateia demonstra que passou um bom tempo desses últimos 25 anos esperando por aquele momento.
Foram duas despedidas. A primeira com “This Little Light of Mine”, no qual apresentou toda a banda e terminou ajoelhado no chão reforçando para quem ainda não tivesse percebido: “Eu sou um prisioneiro do rock”. Na despedida final, voltou ao palco sozinho com seu violão, momento em que ele nos remete e Bob Dylan e Johnny Cash, mas no jeito Bruce de ser, e anunciou a última música, “This Hard Land”. Bruce parecia não se cansar.
Para Peter Ames Carlin, biógrafo de Bruce, o vigor do cantor no palco, em plenos 63 anos, é fruto de uma troca de energia entre ele e o público. “Bruce nunca vai se aposentar. A música é sua respiração. Quando você vê ele no palco, não está vendo um homem e 63 anos. Ele pode mudar de estilo, ou não mudar de estilo, mas parar jamais. A cada show ele se entrega e recebe energia do público. A cada show ele está sugando um pouco da sua energia e juventude”, brincou Peter durante uma conversa em São Paulo com fãs do cantor, no dia seguinte ao show.
Já passava da meia-noite e meia quando todos saíram do Espaço das Américas extasiados com o show que tinham visto. Eram pelo menos três as certezas. Havia sido o melhor show da vida de boa parte dos presentes. A E Street Band é uma das melhores big bands na ativa. Bruce ainda é o poderoso chefão.
Set list
1. Sociedade Alternativa (Raul Seixas Cover)
2. We Take Care of Our Own
3. Badlands
4. Death To My Hometown
5. Spirit in the Night
6. Darkness on the Edge of Town
7. Prove It All Night (com solo de introdução, pedido da plateia)
8. No Surrender (pedido da plateia)
9. Bobby Jean (pedido da plateia)
10. Hungry Heart
11. The River
12. American Skin (41 Shots)
13. Because The Night
14. She’s The One
15. Darlington County
16. Working on the Highway
17. Shackled and Drawn
18. Waiting on a Sunny Day
19. The Rising
20. Thunder Road
21. Land of Hope and Dreams
22. We Are Alive
23. Born in the U.S.A.
24. Born To Run
25. Dancing in the Dark
26. Tenth Avenue Freeze-out
27. Shout
28. This Little Light of Mine
29. This Hard Land (voz e violão)